ENSAIO SOBRE COVID-19
Por Antônio de Oliveira
Não sei se com algum ponto de intersecção, ou não, a pandemia do coronavírus me remete a Saramago, precisamente ao seu “Ensaio sobre a cegueira”. Consultando meus alfarrábios, notei que lera esse livro: SARAMAGO, José. Ensaio sobre a cegueira. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. 312 p. (jun./2002; fonte: empréstimo Dr. Felício Rodrigues, médico Fumec).
O romance versa sobre uma epidemia que acomete repentinamente uma cidade: uma “cegueira branca”, pastosa, como alguém que mergulhasse de olhos abertos num “mar de leite”. Alegoricamente, imagem em branco de uma sociedade que perde o senso do limite entre civilização e barbárie multifacetada.
E não é que está tendo tudo a ver com a pandemia coronavírus? No Ensaio de Saramago são mais ou menos identificáveis algumas referências históricas e literárias, como os campos de concentração nazista, dos quais todo o mundo já ouviu horrores…
A Peste de Albert Camus, publicado em 1947, pouco tempo após o fim da Segunda Guerra Mundial, descreve a ocorrência de outra epidemia, a que assolou a cidade de Orão, na Argélia. Protagonista é um médico, Dr. Bernard Rieux. Esse médico sai de seu consultório e tropeça num rato morto, sinal flagrante de uma epidemia que toma conta de toda a cidade.
Jesus constrói uma parábola a partir da seguinte pergunta preocupante: “Pode um cego guiar outro cego?” Pelo contexto conclui-se que a mesma medida que usarmos para medir o próximo será usada para sermos medidos e julgados.
Bastante matéria para reflexão. “Trevas brancas” descreveriam o olhar daqueles, no caso de toda uma sociedade de cegos, “cegos que veem, cegos que, vendo, não veem”. Prêmio Nobel de Literatura de 1998, o pensamento de Saramago coincide com o do profeta Ezequiel (12, 2): “Eles têm olhos para ver, e não veem”. “Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara” é o que propõe a epígrafe do livro que deu origem, em 2012, ao filme de Fernando Meirelles, com o mesmo nome: Ensaio sobre a cegueira.
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