DISSECANDO O HUMANO DE BARRO

06/03/2020

DISSECANDO O HUMANO DE BARRO

Por Antônio de Oliveira

Prêmio Nobel de Literatura (1948), T. S. Eliot se considerava anglo-católico em religião, clássico em literatura e monarquista em política. Eliot converteu-se ao anglicanismo em 1927. Três anos depois, escreveu o poema Ash-Wednesday (Quarta-feira de Cinzas).

Ave mitológica, fênix durava séculos e, queimada, renascia das próprias cinzas. Entretanto, no “Sermão de Quarta-feira de Cinzas”, lembra Padre Antônio Vieira: “Se perguntardes de quem são pó aquelas cinzas, responder-vos-ão os epitáfios”. Em sentido figurado, cabe o significado de humilhação dorida: cinzas do arrependimento. Pelo atual processo da cremação reduz-se o corpo a cinzas, por vezes lançadas ao mar. Sequer resistem a um brando sopro da viração.

“Lembra-te, ó homem, que és pó e em pó te hás de tornar” (Gênesis). Pó e cinzas se identificam nessa perspectiva. E pensar que desta vida nada se leva! Caixão não tem gaveta para transportar pertences e não pertences. Não funciona como salvo-conduto nem como propinoduto.

Cinzas, pó, lepra. Os leprosos mantinham-se segregados em lugares de eventual purificação. Daí se passava, quando passava, purificado, para o convívio social. O leproso necessitava de sete banhos de purificação para ser considerado limpo, como o fez, depois de muito relutar, o comandante Naamã, banhando-se no Rio Jordão. Ferido de horrível lepra, da cabeça aos pés, o paciente homem Jó foi relegado à exclusão social. Pela palavra “lepra” designavam-se várias doenças de pele, não necessariamente lepra. Pior que a lepra externa é a lepra interna no tecido da alma.

T. S. Eliot: “Because I know that time is always time. And place is always and only place. And what is actual is actual only for one time. And only for one time”. Porque sei que o tempo é sempre o tempo e que o espaço é sempre o espaço apenas e que o real somente o é dentro de um tempo. E é tempo de “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele” (CF-2020). O agora há um segundo não é mais agora.

Autor: O professor Antônio de Oliveira, cronista fascinante, é Mestre em Teologia pela Universidade Gregoriana de Roma, na Itália. Licenciado em Letras e em Estudos Sociais pela Universidade de Itaúna; em Pedagogia e em Filosofia pela Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras de São João del Rei. Estágio Pedagógico na França. Contato: antonioliveira2011@live.com

Photo by Agnieszka W. from FreeImages

Tags:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Sair da versão mobile