O Direito de Ir e Vir
Por Iriam Gomes Starling
Três capitais brasileiras e onze cidades de São Paulo têm greve nessa sexta feira (18 de maio de 2014); manifestantes da greve dos correios ocuparam uma das principais avenidas da cidade de Belo Horizonte (12 de fevereiro de 2014) deixando o trânsito complicado na região; manifestantes sem-teto bloqueiam os dois sentidos da Rodovia Régis Bittencourt, na região metropolitana de São Paulo (04 de setembro de 2012); assentados invadem a rodovia BR-364 (22 de abril de 2014) e provocam congestionamento quilométrico; estas e centenas de outras manchetes de jornais ilustram o quanto o desgoverno, a falta de planejamento urbano e o poder capitalista concentrado nas mãos de algumas centenas de poderosos empresários minam a nossa Constituição.
O direito de ir e vir, garantido pela Constituição Federal de 1988 (Art. 5º – XV), tem sido negado à população de diversas formas. Como dever do poder público: União, Estados e Municípios, o transporte público tem sido negligenciado, deixando o povo à mercê da sorte, contando apenas com seus próprios recursos e a solidariedade de amigos, conhecidos e parentes.
Basta que uma fração da sociedade se revolte por qualquer motivo para que estradas, avenidas e ruas de grande movimento sejam bloqueadas pelos insatisfeitos, causando um enorme transtorno na rotina de milhares de pessoas e, não raro, um caos urbano generalizado.
O bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça são valores supremos de nossa Constituição, tornadas palavras vazias no suposto Estado Democrático brasileiro.
Mas, de quem é a culpa afinal? Culpa: palavra banida do dicionário dos “politicamente corretos”, mas que não pode ser esquecida se quisermos de fato transformar o Brasil em uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. A culpa é do governo, dizem os da oposição, a culpa é da economia internacional, dizem economistas, a culpa é da ignorância que assola esse país, dizem supostos eruditos, não devemos procurar culpados, dizem os politicamente corretos… A “culpa”, na verdade, é de cada um de nós que não pensamos no “outro” em nosso dia-a-dia.
A tolerância com as infrações e crimes, desde os mais banais até os mais graves cometidos por pessoas dos mais variados status socioeconômicos vêm do medo de sermos julgados um dia pelos nossos próprios crimes e infrações, de sermos delatados, descobertos ou surpreendidos. Teríamos uma vida bem mais confortável se cada brasileiro, antes de cometer seu “pequeno” delito o multiplicasse pelos 200 milhões de brasileiros e imaginasse o impacto disso na população e para si mesmo. Seríamos mais seguros se cada um de nós se colocasse no lugar dos pacientes, do enganado, do prejudicado, antes de cometermos nossas pequenas ou grandes infrações.
Será mesmo que não há outra forma de se conseguir ser ouvido sem prejudicar centenas ou mesmo milhares de pessoas? Será que não há outra forma de se reivindicar melhorias sem arriscar a saúde ou mesmo a vida de toda uma população? Será que não há uma forma de cada um se divertir sem perturbar o sono do outro?
O egoísmo, egocentrismo, inveja, ganância e outros tantos “defeitos” humanos devem ser constantemente policiados, vigiados e contidos em prol da sobrevivência não só da humanidade, mas de todo nosso planeta. A vida é preciosa e muito e curta para que a desperdicemos com mesquinharias e vilanias.
Autora: Médica Cirurgiã Geral Iriam Gomes Starling é também graduada em Belas Artes. Trabalha profissionalmente com ilustração médica desde 1985. O primeiro livro ilustrado foi Obstetrícia, do prof. Mário Correa, 1988. Hoje possui milhares de ilustrações publicadas em livros didáticos e periódicos.
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